Série Adolescência: Reflexões Sobre a Nova Minissérie da Netflix
As produções da Netflix frequentemente lançam luz sobre temas complexos e socialmente relevantes, e a série Adolescência não é exceção. Com uma narrativa densa e provocativa, a obra convida o público a refletir sobre as dinâmicas familiares, a vulnerabilidade dos jovens e os desafios da comunicação entre pais e filhos. A série não apenas expõe as dificuldades enfrentadas pelos adolescentes, mas também escancara o impacto das escolhas, ou da falta delas, dos adultos ao seu redor.

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“Pai, você não está entendendo. Você está perdido.”
Essa frase dita pelo adolescente Adam, filho do policial Luke Bascombe, é um dos momentos mais impactantes da minissérie Adolescência, da Netflix. Ela traduz a desconexão entre adultos e adolescentes, tema central da obra. O que acontece quando os adultos acreditam que estão no controle, mas, na realidade, estão perdidos em relação ao que seus filhos sentem, pensam e vivenciam? Adolescência não busca oferecer respostas prontas, mas sim levantar questionamentos profundos sobre essa fase da vida.
Uma Narrativa que Provoca e Desafia Expectativas
A minissérie conta a história de Jamie, um garoto de 13 anos acusado de cometer um crime chocante. Desde o início, a narrativa conduz o público a um jogo de percepção: Jamie é franzino, branco, aparentemente um “bom moço”. Sua fragilidade é enfatizada em cenas impactantes, como quando urina nas calças no início da série, evidenciando o medo e a vulnerabilidade. Esse conjunto de elementos desperta no espectador uma inclinação à empatia, gerando a esperança de que ele seja inocente.
Ao longo dos episódios, no entanto, a série vai desconstruindo essa visão inicial. Não existem respostas simples, e os personagens são apresentados de maneira complexa e multifacetada. Jamie representa muito mais do que um adolescente específico: ele é um símbolo da adolescência negligenciada, das dores silenciadas, da dificuldade em se expressar e da falta de espaço seguro para que os jovens sejam ouvidos.
O Papel da Escola e a Sociedade que Julga
O ambiente escolar é um dos cenários centrais de Adolescência, e a série faz questão de mostrar como a escola falha em proteger seus alunos. O bullying está presente em toda parte, e não apenas Jamie sofre com isso. Katie Leonard, a própria vítima do crime, também era alvo de ataques constantes e, além disso, sofreu sexting, tendo uma foto íntima exposta e ridicularizada, um retrato cruel da misoginia na sociedade.
Ao mesmo tempo, os professores se mostram completamente despreparados para lidar com essas questões. A falta de intervenção eficaz transforma a escola em um espaço onde o sofrimento é normalizado e os problemas dos alunos são ignorados até que se tornem graves demais para serem contornados.
E então surge a sociedade que julga. Os pais de Jamie passam a ser condenados e rotulados. A irmã também carrega o peso de um sobrenome que agora se tornou um estigma. Mas a grande ironia é que as mesmas pessoas que apedrejam essa família, que se perguntam “como não viram?”, são aquelas que também fecham os olhos para o que acontece dentro de seus próprios lares.
A Reflexão Brutal dos Pais: Até onde Poderiam Ter Evitado?
Um dos momentos mais emocionantes da série é a reflexão dos pais de Jamie. O pai admite que sofreu violência doméstica na infância e quis criar o filho de uma maneira diferente. A mãe lembra que sempre tentaram oferecer o melhor: um quarto bem montado, um videogame, conforto. Mas, ao mesmo tempo, confessa que notava que o filho passava cada vez mais tempo isolado no quarto. E ela não viu problema nisso.
O pai se lembra da cena em que não conseguiu olhar para o filho, quando ele não atendeu às expectativas por não ser bom nos esportes. Ele também admite que, mesmo vendo o vídeo, não quis acreditar, não soube lidar.
E quantos pais não fazem o mesmo? Acreditamos que o perigo está nos grandes sinais: nas explosões de raiva, nas agressões físicas, nos comportamentos que fogem completamente da normalidade. Mas e as pequenas coisas? Os silências prolongados, os afastamentos sutis, as mudanças imperceptíveis no comportamento?
A grande lição de Adolescência é que é preciso equilibrar responsabilidade e auto-perdão. Sim, os pais concluem que poderiam ter feito mais. Mas também precisam aceitar que não existe uma fórmula perfeita para criar um filho e que, muitas vezes, os sinais de alerta são quase invisíveis.
O Impacto da Psicóloga e a Importância do Trabalho Profissional
Outro ponto forte da série é a relação entre Jamie e a psicóloga, Dra. Briony Ariston. Essa cena é fundamental porque mostra como um profissional bem preparado pode acessar as verdades que estão escondidas sob camadas de silêncio e autodefesa.
Jamie chega a comparar o trabalho da psicóloga com o de outro profissional que o atendeu anteriormente, mencionando que “ele não fazia perguntas difíceis”. Essa diferença é crucial: enquanto um apenas tocava na superfície, o outro realmente conseguiu penetrar nas camadas emocionais do adolescente, criando um espaço onde ele, finalmente, se abriu.
E isso levanta uma questão importante: quantos profissionais estão realmente preparados para lidar com adolescentes? Quantos conseguem sair da trivialidade e mergulhar nos dilemas dessa fase da vida?
A Vida Segue, Mas O Que Mudamos Com Isso?
A série termina sem um desfecho fechado porque a vida continua. Os policiais seguirão fazendo seu trabalho. Os pais precisarão encontrar um jeito de seguir em frente e reconstruir sua família. A irmã de Jamie precisará lidar com o peso do que aconteceu. A sociedade seguirá julgando, e a maioria das pessoas continuará não enxergando o que acontece dentro de suas próprias casas.E fica o questionamento final: será que vamos aprender algo com essa reflexão? Ou apenas assistiremos à série adolescência e deixaremos tudo seguir como sempre foi?